Universal do Reino: Empresa, Partido ou Igreja?

 



Dom Amaury Castanho

Bispo Emérito de Jundiaí

O ecumenismo, movimento que promove o encontro, o diálogo, a oração e a colaboração comum entre as diversas confissões cristãs, vem me empolgando desde os tempos de seminarista. Como padre e bispo tenho convivido, fraternalmente, com luteranos e presbiterianos, metodistas e fiéis congregacionistas como os da Assembléia de Deus, da Brasil Para Cristo e outras denominações. Relaciono-me, em clima de respeito, com kardecistas, muçulmanos e afro-brasileiros.

Por mais de dez anos, em nome do episcopado paulista, empenhei-me a fundo na organização de encontros ecumênicos estaduais, integrei grupo ecumênico permanente, organizando e participando como bispo de Jundiaí, da fundação e atividades do Movimento Fraterno de Igrejas Cristãs, o MOFIC. Em várias oportunidades preguei em diversas igrejas evangélicas, aceitei convite e falei sobre problemas do casamento e da família em lojas maçônica aqui e ali. Acredito, pois, no diálogo e na convivência fraterna, sonhando com o dia em que os cristãos poderemos realizar o anseio de Cristo: “Um só rebanho e um só Pastor!” (Jo 10,16).

Doutra parte, confesso estar seriamente preocupado com a chamada Igreja Universal do Reino, fundada poucas décadas atrás por Edir Macedo, saído aliás de Rio das Flores, pequeno município de minha ex-diocese de Valença/RJ, antes que lá chegasse como seu Pastor. Venho acompanhando os passos e peripécias de seu fundador, dos seus bispos e obreiros. Hoje a Universal do Reino está por toda a parte, com as suas “catedrais da fé” que impressionam por sua monumentalidade e conforto.

A razão da preocupação que tenho quanto a mais essa, a milésima Igreja evangélica e neo-pentecostal brasileira, não é pelo simples fato de existir. Consta que desde o século XVI, quando o ex-agostiniano Martinho Lutero separou-se da única Igreja fundada por Cristo – recorde-se o leitor do “Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja”, em São Mateus, 16, 18 – os irmãos protestantes que abandonaram a casa paterna dividiram-se nestes cinco séculos em cerca de 50 mil Igrejas independentes entre si! O princípio do “livre exame” da Sagrada Escritura contém uma das explicações da multiplicação e infindável subdivisão das ovelhas desgarradas do único rebanho do Bom Pastor, Cristo.

Mais uma Igreja, melhor, mais cem ou duzentas Igrejas, surgirão entre nós hoje ou amanhã. Fala-se que aparecem duas novas a cada dois dias somente no Brasil! Isenções tributárias também ajudam a compreender o grave problema da existência de tantas outras novas Igrejas. Nós católicos ou pelo menos os Pastores da Igreja católica estamos preparados para essa dolorosa, escandalosa e infindável fragmentação.

Porém, a Igreja Universal do Reino é um problema à parte. Não somente por existir mas, também, porque nem mesmo se relaciona com as demais nos Conselhos de Pastores das grandes cidades brasileiras. Distancia-se e quer distanciar-se pois modestamente se considera a única verdadeira entre milhares de outras Igrejas cristãs. Falta a Edir Macedo e aos seus bispos que se multiplicam do dia para a noite, vários deles “cassados”, como bem recentemente o esperto deputado federal ex-bispo Rodrigues, qualquer característica de apostolicidade.

O que mais me incomoda é que, a cada dia, a Universal afasta-se dos verdadeiros valores que caracterizam o Reino de Deus, ambicionando tornar-se a Igreja do reino dos homens pela busca do poder. Nessa linha que é pública e notória, vive proclamando aos quatro ventos uma “teologia da prosperidade” que já carreou milhões e milhões para os seus cofres. Os irmãos dessa Igreja não me provoquem, porque tenho boa documentação com informações que, aliás, a TV Globo já divulgou, em parte, de norte a sul do Brasil, poucos anos atrás. Há cultos freqüentes, senão diários, em que são feitas até cinco coletas. Quem não se lembra de certa concentração em grande estádio, na qual obreiros da Universal carregavam sacos e sacos de dinheiro obtido de gente pobre, miserável e sofrida, iludida por promessas de curas e milagres, por apelos feitos com requintes de marketing?

Não há mistério quanto à origem dos 25 milhões de dólares bancados, de um dia para outro, na compra da TV Record. A Universal do Reino tornou-se tão rica que, em recentíssima pesquisa sobre as mais poderosas instituições brasileiras, veio logo depois da rede bancária. E os Bancos que se cuidem, pois amanhã poderão passar para o segundo lugar! Não faltam recursos para a compra de terrenos bem localizados e a construção das “catedrais da fé”, em praticamente todas as capitais dos Estados brasileiros. Deus certamente sabe e o Conselho dos Bispos da Universal não tem qualquer dúvida a respeito das fontes dos altos investimentos feitos e que vêm fazendo da Universal, desde o seu princípio, em um verdadeiro conglomerado de empresas, crescendo na base das “franquias”, à semelhança dos Mac Donald’s da vida...

Agora, nestes últimos dias, mais uma fonte de preocupações para os cristãos que prezamos acima de tudo a pessoa de Jesus Cristo, a sua mensagem de amor, simplicidade e justiça. A Universal do Reino vai ter, também, o seu próprio Partido político. Já tem nome, recursos e até candidato para as eleições de 2006: o atual Senador Marcelo Crivella, simpático, mas há pouco derrotado por César Maia no Rio de Janeiro. Tudo que escrevemos é lamentável, mas confirma as péssimas impressões tidas pelo líder evangélico Caio Fábio nos diversos encontros que teve com Edir Macedo. O leitor, se desejar, consulte os últimos capítulos do livro “Confissões do Pastor”, editado pela Editora Record do Rio de Janeiro, em 1997.

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