As Indulgências



Autor: Luiz Mário R. Silva

Fonte: Cavaleiro da Imaculada, Outubro/1996.



Quando meus irmãos e eu éramos crianças, se quebrávamos alguma coisa em casa, meus pais perdoavam, mas sempre faziam questão de que consertássemos o estrago feito, ou repuséssemos o objeto danificado. É claro que, muitas vezes, eles mesmos nos ajudavam a reparar o dano, mas, com certeza, isso contribuiu muito para que fôssemos adquirindo o sentido da responsabilidade.


Na vida espiritual, Deus nos trata de modo semelhante: quando pecamos, Ele sempre está disposto a nos perdoar, mas existe também a pena temporal devida por esses pecados. A confissão, da qual falamos no último número, é o meio ordinário pelo qual somos perdoados dos nossos pecados. No entanto, após termos sido perdoados da culpa do pecado, fica ainda a pena temporal, que devemos purificar aqui, nesta vida, ou na outra, no Purgatório.


Nesta vida, a purificação das penas pode ser obtida pelas boas obras que fazemos em reparação pelos pecados que cometemos: um jejum, uma obra de caridade, uma mortificação, um sofrimento oferecido a Deus, uma oração, tudo isso serve para remir a pena devida. Porém a Igreja, como Mãe nossa, nos proporciona um outro meio eficaz para que possamos pagar a nossa pena: as indulgências.


A Igreja, dispensadora da Redenção


Segundo o Catecismo, "a indulgência é a remissão, perante Deus, da pena temporal devida pelos pecados já perdoados quanto à culpa, que o fiel bem disposto obtém em certas condições determinadas, pela intervenção da Igreja que, como dispensadora da redenção, distribui e aplica por sua autoridade o tesouro das satisfações de Cristo e dos santos" (cf. 1471).


No livro do Gênesis, narra-se a história de José do Egito, que após muitos reveses chegou a ser o administrador do Faraó: o Egito e todos os países da região passavam por uma grande escassez, que acabou se estendendo por sete anos; mas José, fazendo uso do dom da interpretação de sonhos, que recebera de Deus, havia administrado a produção de alimentos de forma que, nos anos anteriores à escassez, conseguira acumular, no Egito, alimentos mais do que suficientes para toda a população; a Bíblia nos diz que José desistiu de medir a quantidade acumulada, porque "ultrapassava toda medida" (Gn 41,49). E aos que o procuravam em busca de auxílio, o Faraó lhes dizia: "Ide a José, e fazei o que ele vos disser" (Gn 41,55).


Os méritos da Redenção de Cristo foram infinitos, porque Ele é a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade. Como Homem e Deus, suas ações têm méritos infinitos, e, portanto, Sua paixão e morte na cruz "ultrapassam toda medida": são superabundantes para perdoar toda culpa e remir toda pena. E além dos méritos de Jesus, a Igreja tem, em seu tesouro de graças, os méritos de Nossa Senhora e de todos os outros santos: assim como José do Egito, a Igreja tem como missão, recebida do próprio Deus, administrar esse tesouro, de modo a colaborar para a salvação de todos os homens.


As condições para recebermos as Indulgências


Então, podemos perguntar: "Quais as condições para recebermos as indulgências?" Basicamente, para se ganhar as indulgências em geral, são três as condições: primeiramente, a indulgência é a remissão da pena temporal, e não da culpa do pecado: esta deve ser perdoada através dos outros meios (abundantes!) que Deus nos colocou à disposição; somente assim estaremos em condições de, pelas indulgências, sermos remidos das penas temporais devidas. O estado de graça é necessário, mas este pode ser obtido enquanto realizamos as obras específicas daquela indulgência, como uma romaria, por exemplo.


Depois, vemos que as indulgências são obtidas pelo fiel bem disposto: a intenção de ganhar a indulgência é necessária, mesmo que seja genérica; como ao longo de um dia as oportunidades de ganhar indulgências são muitas, podemos manifestar a Deus, freqüentemente, a intenção de ganhar todas as indulgências que possamos. Por exemplo, ao acordar, basta manifestarmos a Deus esta intenção, e, ao longo daquele dia, lucraremos todas as indulgências possíveis, desde que as condições sejam cumpridas.


E esta é a terceira condição necessária: cumprir as obras e requisitos prescritos.


Indulgências parciais e plenárias


Como "funciona" a indulgência? Existem as indulgências parciais e as plenárias: as parciais são aquelas que podem remir apenas parte da pena devida. E em que "quantidade"? Bem, a cada boa obra feita, temos remida uma parte da pena: vai depender da obra realizada, e também do amor a Deus com que realizamos a obra. Para aquelas obras que são contempladas com indulgências, a remissão devida é, digamos assim, duplicada: o valor de remissão devido à indulgência será o mesmo devido à obra realizada. Recentemente, recebi uma carta de uma pessoa amiga na qual havia um artigo falando do "supermercado do Céu": era uma bonita comparação, falando sobre as virtudes que necessitamos neste caminho rumo ao Criador. Seguindo a mesma linha de comparação, podemos dizer que as indulgências são como uma "promoção de supermercado": pague um e leve dois!


Já as indulgências plenárias têm o poder de remir toda a pena devida, mas não quer dizer que isso ocorra sempre: se vamos a uma fonte buscar água, a quantidade que traremos dependerá do recipiente que levarmos. Com relação às indulgências plenárias, ocorre de modo semelhante: a remissão que conseguiremos dependerá das disposições que tivermos. Para lucrarmos a remissão de absolutamente toda a pena devida, através de uma indulgência plenária, é necessário estarmos desprendidos de todo pecado, até mesmo dos veniais, e termos um propósito firme de evitar todo pecado, deste momento em diante. Apesar de estas condições serem difíceis de se conseguir, a Igreja concede, pelo menos em parte, a remissão devida, proporcionalmente às nossas disposições.


No caso das indulgências plenárias, existem também três condições a serem cumpridas: oração pelas intenções do Papa, confissão e comunhão eucarística; essas condições não precisam, necessariamente, serem cumpridas no mesmo dia em que lucramos a indulgência plenária, mas é conveniente que seja assim.


A Igreja nos ensina que as nossas orações podem servir também para abreviar as penas das almas do Purgatório; por não se haverem purificado suficientemente, essas almas ainda não podem ter a visão beatífica, ou seja, não estão em condições de participar do encontro definitivo com o Criador. Por este motivo estão no Purgatório, palavra que significa "lugar de purificação, de expiação". Mas, além das nossas orações e boas obras, podemos oferecer as indulgências que ganharmos (parciais e plenárias) por essas almas.


Exemplos de Indulgências


Falamos, até agora, do que são as indulgências, como "funcionam", as condições necessárias para ganhá-las, etc. Vamos, agora, para finalizar, dar alguns exemplos de algumas das muitas indulgências que a Igreja nos oferece. Ao rezarmos um terço, podemos lucrar uma indulgência parcial; o mesmo se aplica à utilização do rosário (objeto) abençoado. Se o terço for rezado em família, meditando os mistérios e sem interrupção, podemos ganhar um indulgência plenária.


Através da Via Sacra, que muitos têm o costume de rezar durante a Quaresma, podemos obter também uma indulgência parcial, se a fizermos indo de estação em estação e meditando-as; as visitas ao cemitério, nos dias de finados, rezando pelos mortos, concedem-nos indulgências plenárias: essas podem ser aplicadas especialmente às almas do Purgatório. A leitura da Bíblia, uma visita eucarística, que muitos têm o costume de fazer com freqüência, são contempladas com indulgências parciais, e, dependendo das condições (se se prolongam por meia hora), podem ser plenárias.


São muitas as boas obras pelas quais podemos receber indulgência. Poderemos nos aprofundar mais neste assunto através de alguma outra leitura ou estudo, ou, ainda, conversando com um sacerdote ou outra pessoa que nos possa esclarecer... O que não devemos fazer é deixar de utilizar este poderoso benefício que a Igreja nos concede.

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