O protestantismo no Brasil

 



Autor: Dom Amaury Castanho

Jundiaí (SP), 5/11/2003 - 09:09


O Novo Mundo, a América e o Brasil, nasceram católicos. Os espanhóis liderados por Cristóvão Colombo que, em 1492, desembarcaram na ilha caribenha de São Domingos, ao norte do continente e os portugueses, que pouco depois, em 1500, aportavam em Cabrália, na Bahia, descobrindo novas rotas, terras e povos tiveram, inegavelmente, além de interesses políticos e econômicos, o objetivo de dilatarem a fé.


As caravelas comandadas por Pedro Álvares Cabral, trouxeram de Portugal uma bela imagem de Nossa Senhora da Esperança e, também, os primeiros franciscanos. Apenas em terra, ergueu-se o madeiro da cruz, dando-se ao novo país o nome de Terra de Santa Cruz. Em rústico altar, portugueses de fé e indígenas admirados, assistiram a primeira Missa celebrada por Frei Henrique de Coimbra. Nem mesmo a França, tida como "filha primogênita da Igreja", teve os seus primeiros dias tão fortemente marcados pela fé e presença da Igreja.


Logo mais, com o retorno das caravelas portuguesas viriam, também, os beneditinos, os mercedários e jesuítas. Enviados por Inácio de Loyola, estes se tornariam os primeiros catequistas e defensores dos tupis-guaranis. O jovem Padre José de Anchieta e seu superior Manoel da Nóbrega, aculturados, percorreram, incansavelmente, as principais Capitanias civilizando e evangelizando os silvícolas nas Escolas que abriam por toda parte. Em breve, as lideranças indígenas estariam convertidas.


Era de prever, no contexto do século XVI, que a Holanda e a França, já marcadamente protestantes, interessadas nas riquezas do Novo Mundo, voltassem seus olhos para cá. Em 1626 os holandeses desembarcaram na Bahia dispostos a tudo, expandindo-se para Pernambuco, Maranhão e outras Capitanias. O pau-brasil e o açúcar interessavam tanto à recém criada Nova Holanda quanto à difusão do luteranismo. Maurício de Nassau firmou o domínio holandês, até que as célebres pregações do Padre Antônio Vieira, despertaram os brios e deram a força de que necessitavam os portugueses e os indígenas para a definitiva expulsão dos hereges invasores.


Os franceses, huguenotes, optaram pelo Rio de Janeiro. Liderados por Jean F. Duclerc e, posteriormente, por Nicolas Villegagnon, em 1555, antes dos holandeses, já haviam se estabelecido na futura segunda Capital do Brasil. Também eles, além do interesse pelo ouro e pedras preciosas descobertos pelos Bandeirantes paulistas, nas Minas Gerais, objetivavam impor aos brasís o calvinismo que os empolgava. Os Capitães-Mór e os indígenas, incentivados pelos jesuítas Antônio Vieira e José de Anchieta, acabaram expulsando os invasores para o mar e suas terras.


Pouco a pouco o Brasil, seus colonizadores portugueses, os missionários, os indígenas e posteriormente os escravos vindos da África, convertidos, formaram um país marcadamente católico. El Rey dava força não apenas às suas tropas mas, também, ao trabalho de evangelização e catequese. Salvador, ainda a Capital, se transformava na primeira sede episcopal. Multiplicavam-se as capelas por todo o nordeste, norte, centro e sul do país, além das escolas jesuíticas. Os novos aglomerados urbanos surgiam a partir de uma igreja. Os numerosos franciscanos, beneditinos, mercedários e, particularmente, os jesuítas, firmavam a fé católica por toda a América do Sul e Central, gestando novos povos e nações fiéis à Espanha, a Portugal e à Igreja de Roma.


Durante os séculos do Brasil Colônia e Império, a Igreja católica sempre foi a religião oficial do Estado. O Novo Mundo, assim como a África e a distante Ásia, eram novos espaços da fé católica, golpeada no Velho Mundo pelos reformadores - luteranos, calvinistas e anglicanos - e a partir do século XVII - os anabatistas, metodistas e outros. Pouco a pouco o nosso seria para a Igreja católica "o continente da esperança". O Padroado, embora tolhendo a liberdade dos bispos e missionários, defensores dos direitos, da dignidade e vida dos indígenas, oferecia à Igreja católica a proteção que, por outro lado, dificultava ao máximo a chegada e difusão do protestantismo.


Na realidade, é fácil perceber que os "evangélicos" europeus não se conformariam com essa situação. Depois da primeira "onda" com as frustradas invasões dos franceses calvinistas e holandeses luteranos, pode-se afirmar que uma segunda "onda" menos ostensiva, sem o respaldo de tropas e armas, dar-se-ia no século XIX. A terceira, bem mais agressiva e preocupante, seria a do século XX. Vai para um século e meio, chegavam ao sul do país os imigrantes luteranos e, na então Província de São Paulo os presbiterianos e anglicanos.


De 1900 em diante, no início do século passado, a chegada dos protestantes congregacionais e, décadas depois, a notável expansão dos pentecostais, viria a tornar-se um novo e grande problema. Em pouco mais de um século, de 1889, quando foi proclamada a República, até o ano 2000, perdemos a unidade religiosa, tão importante, ficando ameaçada a unidade de nosso povo. Os católicos que éramos, no fim do Império, 98% da população, descemos para 73,8% no Censo 2000. Os "evangélicos" subiram para expressivos 15%, com nítida predominância dos pentecostais e neo-pentecostais. Eram 26 milhões dos 170 milhões de brasileiros, restando 10% de afro-brasileiros, budistas, agnósticos e descrentes sem filiação a qualquer grupo religioso.


Espero poder retornar ao assunto no artigo da próxima semana. Tentarei, posteriormente, refletir sobre as causas que levaram ao êxodo de tantos católicos para a Assembléia de Deus, a Congregação Cristã do Brasil, os Batistas e outras Igrejas como a Universal do Reino. E, Deus permitindo, refletiremos, também, sobre as respostas que a Igreja católica tem o dever de dar a essa nova e desafiadora situação religiosa do país.


Fonte: Dom Amaury Castanho - Bispo Diocesano de Jundiaí

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