Crescei e multiplicai-vos

 


Autor: John Nascimento


Há alguns textos da Bíblia que nos colocam perante certas dúvidas ou Conceitos Inverosímeis, que requerem por isso alguns esclarecimentos.


- Também vos dou todas as ervas com semente que existem à superfície da terra (...) para que vos sirvam de alimento.(Gn.1,29).


Uma lenda antiga, que transparece na Bíblia, afirmava que os homens e os animais, no princípio, eram herbívoros.


Só depois é que se foram estragando, como um objecto novo que se gasta com o uso, e depois é que os animais se começaram a comer uns aos outros.


A Bíblia serve-se desta lenda para manifestar que o homem se deteriorou com o pecado.


Trata-se de uma explicação religiosa e popular do facto chocante da «luta pela vida».


- Deus formou o homem do pó da terra.(Gn.2,7).


Não se trata duma narração científica.


Em linguagem popular o texto sagrado manifesta-nos que o Homem (Humanidade) é obra de Deus e que Deus tem por ele uma especial predilecção.


- A árvore da vida no meio do jardim; da ciência do bem e do mal.(Gn.1,9).


Trata-se de símbolos tirados das lendas de então.


Ser imortal, e fazer tudo o que nos apetece sem estarmos sujeitos às leis do Bem e do Mal, sempre foi uma grande aspiração dos mortais.


- A serpente, o mais astuto dos animais.(Gn.3,1).


Apesar do medo e horror pela serpente, os Orientais consideravam-na como a deusa da fertilidade.


Por isso o autor bíblico a tomou como símbolo do mal que rói a Humanidade, e combate também os adoradores das serpentes, ensinando que Deus é o autor da vida.


- Vendo a mulher que o fruto da árvore devia ser bom para comer(...)comeu, deu dele a seu marido.(Gn.3,6).


A origem do mal no mundo, é um dos problemas mais sérios que o Homem se põe a si mesmo.


Também ele aparece na Bíblia.


A resposta é :


- NÃO é Deus a causa do mal, como pensavam os Persas e outros.


A causa deve procurar-se nas criaturas.


Esta sombra fatídica do mal e do pecado alonga-se pelo crime de Caim e dos seus descendentes por toda a Humanidade.


Daí os castigos para o homem, para a mulher e para a serpente, apresentados segundo a mentalidade do autor sagrado e os condicionalismos do seu tempo com o seu esforço e sob a inspiração divina, para tentar dar uma explicação ao sofrimento do trabalho, às dores do parto e à morte.


- Rastejarás sobre o teu ventre, alimentar-te-ás de terra. (Gn.3,14).


Os Hebreus pensavam erradamente que as serpentes se alimentavam de terra, e assim o hagiógrafo apresenta-a a alimentar-se da terra como um castigo, mas nós sabemos que elas são animais carnívoros.


- O Senhor Deus percorria o jardim. (Gn.3,8).


Numa linguagem romanceada, de grande vigor psicológico, Deus é apresentado como um amigo do homem que, sem saber de nada, percorre o jardim.


Esta «ignorância divina» é assim um artifício literário para introduzir o diálogo que se segue, entre Deus e o homem depois do pecado.


Idêntico processo literário levara o hagiógrafo a pôr a serpente a falar.


Apesar das lendas populares, é evidente que os animais nunca falaram.


- O Senhor Deus chamou o homem e disse-lhe.(Gn.3,9).


Não sabemos exactamente como é que Deus comunicou com o homem, provavelmente, apenas através da sua voz, fazendo-se ouvir, mas também não podemos saber que espécie de língua falavam Adão e Eva, desde que foram criados, e na qual Deus comunicou com eles.


Por outras vezes Deus falou com os homens, a Moisés, no Baptismo de Cristo e na Transfiguração, e apenas se ouviu a sua voz.


Das línguas primitivas nada sabemos até que foi possível usar qualquer espécie de escrita.


- Então abriram-se os olhos aos dois, reconhecendo que estavam nus.(Gn.3,7).


Certamente que já tinham reconhecido que estavam nus, só que a atracção sexual não era motivada por concupiscência.


Se não tivessem pecado, teriam igualmente que cumprir o mandato de Deus, de «Crescei e multiplicai-vos»(Gn.1,28).


- Abel foi pastor e Caim lavrador.(Gn.4,2).


Estes conceitos colocados logo no princípio da humanidade, estão errados, mas reflectem a mentalidade do tempo em que foram escritos, pelo que se não devem interpretar à letra mas sim como uma mensagem religiosa.


Primeiro os homens foram herbívoros e só depois de repararem que alguns animais comiam outros, realizaram que podiam também comer outra coisa que não fossem os frutos e os vegetais.


Mas isto, como tantas outras coisas, só depois de muito tempo se alcançou, e ainda levou muito mais tempo até que, depois de descoberto o processo de fazer lume, se preparassem os alimentos com o fogo.


Temos que ter também em conta que toda a Bíblia do Antigo Testamento começou por se difundir por tradição oral até que começasse a ser posta por escrito.


Durante todo este tempo, os conceitos humanos, orientados para a Redenção prometida no Proto-Evangelho, foram evoluindo lentamente, embora fiel ao essencial da Mensagem, e ainda sujeitos a interpretações e erros humanos.


Vamos encontrar isto ao longo de todo o Antigo Testamento.


Embora aparentemente Inverosímeis, todos estes e outros Conceitos têm que ser vistos e aceites à luz dos condicionalismos de cada época, ainda que sob a inspiração divina, sem a qual não era possível que eles chegassem até nós.


Qualquer erro aparente ou contradição, não põe em risco a inspiração da Bíblia no seu sentido literário, porque o que se deve ter em conta é a mensagem da Bíblia e não o sentido das palavras, as quais estão dentro do condicionalismo próprio do tempo em que foram escritas.


John Nascimento

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