O protestantismo no Brasil Parte 4

 


Autor: Dom Amaury Castanho


Jundiaí (SP), 25/11/2003 - 08:59



OS PORQUÊS DO FENÔMENO PENTECOSTAL


Dias atrás estivemos reunidos no Mosteiro de Itaici, cerca de 400 dirigentes católicos do Estado de São Paulo. A chamada "Assembléia das Igrejas", do Regional Sul 1 da CNBB, levou os bispos, sacerdotes, diáconos, religiosas e fiéis leigos da capital e do interior paulista, à definição de um "Projeto de Ação Missionária Permanente" que, envolvendo ainda mais toda a Igreja, na evangelização e na catequese, missão, graça e vocação que lhe são próprias, possa vir a dar, também, uma resposta à altura, ao preocupante fenômeno da difusão das Igrejas pentecostais.



Mais uma vez, o sociólogo e professor João Clemente de Souza Neto, colocou diante de todos o quadro da difusão dos protestantes nas últimas décadas. Mas, aprofundando as suas reflexões, com novos gráficos e mapas, não hesitou em afirmar que "os evangélicos pentecostais estão demonstrando melhor habilidade de acolher e dar assistência às pessoas". Corajosamente, ele não teve dúvidas de dizer que "a Igreja católica se desviou de seu objetivo, dando mais importância às questões sociais" (Ata da primeira sessão de 21 de novembro). É exatamente o que venho repetindo há pelo menos vinte anos!



As informações estatísticas que nos foram dadas a partir do Censo 2000 e do "Atlas da Filiação Religiosa" elaborado pelo CERIS em 2003, dão 26.452.171 de protestantes brasileiros. Desse total 8.477.068 pertencem às Igrejas "históricas" - luteranos, anglicanos, presbiterianos e metodistas - e 17.975.106 às Igrejas "pentecostais". A Assembléia de Deus conta com 47,47% (8.418.154), a Congregação Cristã do Brasil com 14,04% (2.489.079), a Universal do Reino de Deus com 11,85% (2.101.884), a do Evangelho Quadrangular com 7,44% (1.313.812) e a Deus é Amor com 4,37% (774.827). As demais Igrejas, milhares, sempre de linha não ecumênica são minoritárias.



Procurarei, com a concisão possível, declinar as causas do inegável fenômeno da difusão dos "pentecostais", nos últimos trinta anos de nossa história. Com certeza, estão entre elas a priorização que deram à evangelização, os altos investimentos em rádios e televisão, o seu agressivo marketing, o melhor acolhimento aos que deles se aproximam, a resposta dada aos problemas do dia a dia dos brasileiros, a sua forte presença nas periferias urbanas, o inegável testemunho de uma vida coerente, a sua opção pela "teologia da prosperidade" e, de anos para cá, a luta pela conquista do poder político como domínio.



Raramente, os "pentecostais" tratam de problemas sociais. Centraram a sua pregação na pessoa de Jesus Cristo, em seu ensino, enquanto nós continuamos falando demais em direitos humanos, reforma agrária, defesa da cultura e das reservas indígenas, em questões de moradia, emprego e outras marcadamente sociais, quando não político-partidárias. Não deixa de ser curioso que a absoluta maioria dos que abandonaram a Igreja católica, debandando para as "pentecostais", são de classes pobres...



Os investimentos feitos na mídia moderna pelos "pentecostais", particularmente pela Universal do Reino, são altíssimos. Adquiriram por 25 milhões de dólares a TV Record que, aliás, cobre todo o Brasil com suas centenas de retransmissoras. As rádios e programas evangélicos em espaços pagos, cobrem horas e horas do dia e da noite, chegando a ser irritantes. T6em com boas revistas e jornais. Distribuem, gratuitamente, de casa em casa, milhões de Bíblias e folhetos bem feitos. Nós somente viemos a ter as nossas redes de televisão com 50 anos de atraso! Nossas 200 rádios, em geral regionais, ficam bem longe em número das emissoras em mãos dos "pentecostais".



Queiramos ou não, impressiona o marketing dos protestantes. Na divulgação de suas Igrejas e atividades eles nos deram lições até bem poucos anos. Seus templos ficam abertos de domingo a domingo, chegando a ter até três cultos em segundas-feiras (sic!). Por menor que sejam as suas igrejas, freqüentemente pequenos salões, são facilmente identificáveis. Hoje não poucos deles estão em grandes avenidas e pontos estratégicos das nossas cidades.



Pesquisa feita anos atrás, apontou como principal motivo da passagem de católicos para as Igrejas "pentecostais", o acolhimento que não tiveram em nossas igrejas. Bem cedo eles se integram, promovidos a obreiros e pastores. Inúmeros dos nossos presbíteros não têm tempo para acolher, ouvir e confortar os próprios fiéis...



As pregações dos "pentecostais", em suas igrejas, rádios e programas televisivos, centram-se nos problemas do dia a dia das pessoas. Em seus sofrimentos e anseios, no desemprego, nas desilusões afetivas e nos problemas financeiros. As referências bíblicas são freqüentes, ainda que pincem na Palavra de Deus, o que lhes interessa e fora do devido contexto. Mas é, sem dúvida, uma pregação envolvente.



Já me referi à notável presença dos evangélicos nas periferias urbanas. Mesmo em regiões onde a Igreja católica está fortemente presente, para cada comunidade dos nossos fiéis há em média dez templos "pentecostais". Em São Paulo, no Rio de Janeiro e outras capitais é mais visível essa presença. Nas duas maiores cidades brasileiras, os católicos já não passam de 60% a 65% da população, ocupando mais os espaços dos centros urbanos. Na periferia dominam, queiramos ou não, os evangélicos.



Alguém, em um plenário da Assembléia das Igrejas a que me referi acima, teve a coragem de dizer que em sua quase totalidade os "pentecostais" têm famílias bem estruturadas, levando muito a sério o seu compromisso dizimista e, em geral, se comportando com mais dignidade na vida profissional e pública. Sentem-se orgulhosos de suas Igrejas e são ousados na proclamação do que crêem. Repetem em todo culto, nos programas de rádio e televisão que pagar o dízimo e ser generosos com suas Igrejas, lhes retornará o cêntuplo. Se é verdade que freqünetemente chantageiam prometendo resolver todos os problemas com milagres, não é menos verdade que convencem a muitos dos mais sofridos e fracassados na vida. A inegável luta pela conquista do poder que vêm travando, merecerá uma referência mais adiante.



O certo é que nós católicos temos algumas coisas a aprender com os evangélicos "pentecostais". Urge o dever de reavaliarmos as nossas diretrizes, prioridades e investimentos. Ainda é tempo de um empenho bem maior na evangelização e catequese de nossas crianças, jovens e adultos. Não temos o direito de cruzar os braços enquanto todos os nossos fiéis não se tornarem adultos na fé, assumindo os compromissos do próprio batismo e crisma.


Fonte:  Dom Amaury Castanho - Bispo Diocesano de Jundiaí

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